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"A Indústria dos Sentidos" de Sergio Bellucci. As três principais novidades do capitalismo contemporâneo

A invenção da fotografia e, posteriormente, da cinematografia, marcou a grande revolução, a passagem de época, da arte destinada aos poucos afortunados que dela puderam estar próximos, para poder desfrutá-la com todos os sentidos possíveis, ao muitos que em cada parte puderam conhecer e compartilhar.

"A Indústria dos Sentidos" de Sergio Bellucci. As três principais novidades do capitalismo contemporâneo

O tema da reprodutibilidade, da acessibilidade, às grandes (mas também às microscópicas) heranças da produção artística de toda a humanidade entra assim na era da globalidade. A era da visualização privada e pessoal acabou, ou pelo menos foi redimensionada, e estamos entrando rapidamente na era da difusão digital. A cultura e a arte estão indissociavelmente ligadas à grande revolução industrial que em todo o mundo, nos dois séculos anteriores, permitiu a mutação genética e a evolução de uma produção "artesanal" única e limitada entre quem produz e quem beneficia da nova dimensão "industrial "destinado ao grande consumo.

Este é o tema de A indústria dos sentidos, assinado por Sérgio Bellucci e há poucos dias na livraria, com uma erudita e preciosa introdução de Alberto Abruzzese, conhecido e apreciado sociólogo. Comecemos com algumas de suas reflexões: hoje parece objetivamente difícil enfrentar um debate completo e orgânico sobre as dimensões que assumem as grandes transformações sociais e culturais que atravessam o mundo inteiro. Toda a humanidade, e portanto em todas as formas como interage, se manifesta e se expressa e ao meio que a rodeia através de expressões artísticas, está sujeita e ao mesmo tempo sujeita a viver numa velocidade sideral onde é muito complexo decifrar mensagens e conteúdo. 

Simplificando e quiçá banalizando, a nossa época, a nossa contemporaneidade, define-se como a “civilização das imagens” onde todo o fenómeno só assume relevância se for capaz de se tornar “mercadoria” e por isso ser produzido, distribuído e comercializado com critérios, aliás, “ industrial". Não é por acaso que falamos e lemos com frequência sobre a “indústria da arte”. Nesta frente Bellucci, um físico com grande atenção às tecnologias de comunicação, aborda um panorama histórico denso e cheio de dificuldades e complexidades sobre a indústria dos sentidos, suas perspectivas tecnológicas que terão um impacto cada vez maior, talvez até devastador, sobre o futuro da produção e distribuição de arte. Basta ter em mente o que acontecerá com o advento da nova "civilização do algoritmo" capaz, talvez, de nos projetar para dimensões que já poderiam estar além das conceituações canônicas de "indústria". O autor escreve: “Milhões de pessoas trocam serviços, presentes, sugestões, objetos e quebram velhas formas de produção que pareciam imóveis. Bilhões de pessoas estão começando a se encontrar, conversar, compartilhar, conhecer novas culturas e novas formas de viver que ainda não foram aprovadas pela indústria do significado”. 

O título do livro de Bellucci lembra fortemente pelo menos dois outros textos que de alguma forma nos ajudaram a entender, pelo menos em parte, o que estava para acontecer (e aconteceu) ao nosso redor. O primeiro é um ensaio de Roland Barthes, O império dos signos, onde é fácil conectar e tornar dialéticos os dois termos: sentidos e sinais. o segundo é Apocalíptico e integrado de Umberto Eco onde, já em 1964, nos alertava sobre as novas dimensões da comunicação de massa.

Algumas leituras talvez excessivamente politizadas que Bellucci propõe podem nem sempre ser aceitáveis, mas não deixa de ser uma intenção e uma proposição que merece ser abordada: A indústria dos sentidos merece mais atenção, mesmo da parte da política, do que lhe é dada atualmente.

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