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Covid-19: Brasil alarma, Bolsonaro rumo ao impeachment?

Enquanto o Imperial College London adverte que o Brasil tem a maior taxa de infecção do mundo, o presidente desvia as atenções da catástrofe anunciada com manobras políticas que têm como único objetivo eliminar aliados incômodos.

Covid-19: Brasil alarma, Bolsonaro rumo ao impeachment?

A confusão é grande sob o céu de Brasília. Enquanto os mortos e os infectados com o coronavírus estão crescendo exponencialmente, o presidente Jair Bolsonaro desencadeia seu arsenal de armas de distração em massa para desviar a atenção da catástrofe anunciada.

Em vez de focar no combate ao vírus, o presidente intensificou sua campanha nos últimos dias declarações absurdas e manobras políticas para se livrar de aliados desconfortáveis. No dia em que o Brasil ultrapassou a China em número de mortes, ele minimizou: “E daí? Me desculpe, mas o que você quer que eu faça? Eu sou o Messias (seu nome do meio é Messias, ed), mas não faço milagres”.

Alguns dias depois, em uma postagem no Facebook, posteriormente excluída, Bolsonaro acusou a OMS de encorajar a masturbação e homossexualidade entre crianças. Uma fake news que mostra o modus operandi bolsonarista online desde os tempos da campanha eleitoral de 2018: confundir para distrair.

O presidente não está sozinho nesta operação guerra virtual contra tudo e todos. Também nas redes sociais, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, atacou a China, acusando-a de usar o vírus para "dominar o mundo". Para tirar sarro dos chineses, o post foi escrito substituindo todas as letras R por L.

Declarações que naturalmente provocaram uma dura reação de Pequim, principal parceiro comercial do Brasil, mas que vão de par com as do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, segundo o qual os chineses pretendem implementar o “comunavírus”, o vírus comunista, No mundo todo.

Entre teorias da conspiração, Bolsonaro está viajando pelo país fazer comícios causando reuniões de apoiadores. O último episódio aconteceu na quinta-feira, em Porto Alegre. Ações que contrariam as recomendações de distanciamento social do próprio Ministério da Saúde.

Ao desacreditar toda a comunidade científica e desmentir as notícias dramáticas que chegam da Europa e dos Estados Unidos, o presidente continua acreditando que o coronavírus é uma simples “febre” a ser tratada com cloroquina. No entanto, até mesmo Donald Trump reconheceu a gravidade da situação brasileira. “Odeio dizer isso, mas o Brasil está em alta, o gráfico está em alta, em alta. Lá em cima, quase vertical. O presidente brasileiro é meu amigo, um homem muito bom, mas eles estão passando por um momento muito difícil."

Enquanto isso, o comportamento de Bolsonaro de não querer mostrar ao público o resultado dos dois exames a que foi submetido ao voltar de uma viagem aos Estados Unidos em que 24 integrantes do partido presidencial deram positivo está levantando suspeitas. Quinta-feira um juiz deu 48 horas divulgar publicamente os resultados dos exames.

O presidente sempre disse que testou negativo, mas se descobrir que mentiu, sua situação política se complicaria ainda mais. Da oposição e na mídia de fato o pedido de impeachment está se tornando cada vez mais difundido, embora, segundo pesquisa do Datafolha, apenas 45% dos brasileiros sejam a favor e 48% contra.

Mesmo no Congresso, o lugar onde os números realmente importam, não há maioria a favor do impeachment. Na verdade, Bolsonaro está fazendo acordos para dividir as cadeiras e garantir o apoio dos partidos do chamado Centrão, uma espécie de grupo de líderes com molho brasileiro.

A mudança é inesperada, já que o ex-capitão do exército sempre surfou na onda anti-casta e anti-establishment, mas pode ser explicada por um vento que dá sinais de mudança no país e com o enfraquecimento do governo causado pelos vazamentos de peças importantes.

De fato, dentro de duas semanas, o presidente expulsou o ministro da saúde Luiz Henrique Mandetta, culpado de defender medidas de isolamento social, e o chefe da Polícia Federal, culpado de defender a autonomia da corporação de ingerências políticas.

Eles juntaram os dois a renúncia de Sérgio Moro, o ministro da Justiça e figurão do governo. Moro é de fato o ex-juiz da Lava Jato, o verde-ouro Mani Pulite, e deu legitimidade ao governo no combate à corrupção.

Despedidas que teriam enorme repercussão política em situação normal, muito menos em tempos de covid-19. E que também serviram para desviar grande parte das atenções e energias na luta contra a pandemia.

Tudo isso acontece enquanto o Imperial College London aconselha que Brasil tem a maior taxa de infecção do mundo – cada paciente infecta outros 2,8 – e que na próxima semana haverá mais 5.580 mortes, 797 por dia, praticamente os mesmos níveis registrados na Itália no auge da crise.

Atualmente as vítimas oficiais são mais de 6 mil (mais que a China) e 87 mil infetados, mas como não existe uma política de testagem massiva, os números reais seriam muito maiores. Alguns especialistas calculam o número de pessoas infectadas em 1 milhão.

As imagens das valas comuns vindas de Manaus e dos corpos abandonados nos corredores do hospital da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, falam por si. O Brasil, com 209 milhões de habitantes, está a caminho de um dos maiores índices de mortes no mundo.

Por outro lado, o ex-ministro da Saúde Mandetta havia alertado: “Não acho que Bolsonaro esteja me demitindo. Ele está disparando a ciência".

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