comparatilhe

Salvati: "Três peças fáceis sobre a Itália: Democracia, crise econômica, Berlusconi"

UM LIVRO DE MICHELE SALVATI ON ITÁLIA – Cortesia da editora Il Mulino publicamos um trecho do novo livro “Três peças fáceis sobre a Itália” de Michele Salvati, economista e ex-parlamentar, focado na parábola política de Silvio Berlusconi e nos motivos de seu fracasso em reformar

Salvati: "Três peças fáceis sobre a Itália: Democracia, crise econômica, Berlusconi"

"Muitas razões foram dadas para explicar a incapacidade reformista dos governos de Berlusconi e me limito a citar as duas que me parecem as mais importantes.

A primeira preocupa os interesses e a cultura das classes que apoiam eleitoralmente a Liga e Berlusconi. Giulio Tremonti foi talvez o último a adotar categorias marxistas (gramscianas) na análise eleitoral e fala de um "bloco social" produtivo e progressista, em grande parte sediado no Norte do país e formado por pessoas que tiram seus recursos do mercado (pequenos empresários, artesãos, comerciantes, IVA, trabalhadores independentes, profissionais), a que se oporia um outro bloco social constituído por funcionários públicos e outros que vivem da intermediação do Estado, sobretudo no Sul. O primeiro "bloco" seria apoiaria a contra-direita e esta votaria predominantemente à esquerda.

É uma interpretação que vaza de vários lados e basta a leitura de uma obra séria de sociologia eleitoral (por exemplo o livro de Bellucci e Segatti, já citado) para percebê-la. Mas mesmo se reconhecermos o que é verdade na análise de Tremonti – é verdade que em algumas regiões do Norte o grosso das classes acima mencionadas vota principalmente em Bossi e Berlusconi – resta mostrar que este bloco social é produtivo e progressista, que está disposto a aceitar com entusiasmo as reformas modernizadoras e liberais. Ele está pedindo impostos mais baixos e melhores serviços públicos, e isso é compreensível. Mas também exige proteção e defesa contra a concorrência. É uma classe que se arrasta nas difíceis condições económicas das últimas duas décadas, que lhes chega em grande medida despreparada, habituada ao clima menos competitivo e às políticas frouxas da Primeira República, uma classe que já não está em grande medida o jogo. E são de facto relativamente poucos (face à dimensão do país) os pequenos negócios que conseguiram adaptar-se à concorrência internacional, para não falar dos trabalhadores independentes, comerciantes, artesãos e profissionais liberais, agarrando-se desesperadamente às suas defesas corporativas e categóricas. Se esses foram e são seus eleitores, não é difícil entender por que Berlusconi não deu continuidade ao programa liberal anunciado na época de sua "descida ao campo".

Mas se ele quisesse, poderia? Assim, chego à segunda razão que poderia explicar a falta de ímpeto reformador dos governos Berlusconi. Não creio que o pedido de reformas de Berlusconi que adapte nossa Constituição à situação bipolar da Segunda República tenha muito a ver com a necessidade de levar adiante reformas necessárias, mas difíceis, que conflitam com os interesses, mentalidades e questões de sua própria constituintes. Em suma, com reais necessidades de governança e progresso. Mas acredito que - se houvesse uma classe política sensível a essas necessidades - seria necessária uma reforma constitucional: a Constituição de 1948, com seu igual bicameralismo, com seu parlamentarismo, limita severamente a capacidade de um governo de implementar rapidamente o programa eleitoral com base no qual ganhou as eleições.

De qualquer forma, seria difícil aprovar um programa altamente inovador, e até mesmo Reagan e Thatcher estavam enfrentando sérias dificuldades. Mas não tão forte quanto teria acontecido na Itália, sendo uma facilitada pela Constituição americana de governo dividido, que era então a seu favor, a outra pelo sistema de Westminster e pelos poderes que confere ao primeiro-ministro quando sua maioria é unidos.”

Comente