comparatilhe

Conto de Domingo: "Ratafià" de Antonella Ossorio

Numa Nápoles ammurròna, quase cacofônica, supersticiosa, cidade de "homens e senhores", respeitosas saudações e profusão de vénias, a vida de Clara é literalmente consumida.
Forçada pela boa tradição a cuidar da mãe, uma "velha" que a aprisiona numa vida inútil, a única liberdade que ela se permite é odiar o próximo sem limites. Pelo menos até que uma garrafa de ratafià lhe ofereça a chance de mudar seu destino...
Antonella Ossorio volta para lhe contar Nàpule, mirando direto no coração: o das pessoas que ali vivem, tornando-o uma criatura palpitante, de fortes paixões.

Conto de Domingo: "Ratafià" de Antonella Ossorio

Clara atravessa a multidão de sábado à tarde, agora quase sábado à noite. Casais de idosos com passos sincronizados disputam a calçada com famílias de licença.

"Livre?" pensa Clara.

Basta olhar para eles para entender que são bombas prestes a explodir, mas não abrem mão do ritual do passeio de sábado. Só que depois vão para casa com fel na boca e um caroço de ódio colocado no meio do peito que vão tentar engolir junto com o jantar. Ah, lindas famílias, pilares da comunidade!

Clara aponta para um: mãe, pai e filho, parados em frente à sorveteria. A situação parece promissora, com a infanta chutando e gritando por um cone negado e a mulher que, alternando promessas e ameaças, tenta em vão conter sua fúria. Enquanto isso, o homem observa a cena, catatônico.

"Será um daqueles que fecham o inteinterruptor do cérebro no comando” pensa Clara. Então conte mentalmente: “Um, dois, três…”.

Da mão da mulher leva um tapa que acerta a cara da pirralha, fazendo-a chorar lágrimas de verdade. Brutalmente acordado, oo homem começa a sacramentar.

"Estrondo!" regozija-se Clara. E, enquanto a briga explode violentamente, ele se afasta. Dada a previsibilidade do epílogo, ela se sente como uma Cassandra barata. Mas ainda são satisfações. Também não a incomoda saber que é má, porque a perfídia é agora seu único impulso vital e sem ela ela estaria perdida.

Mais adiante, próximo ao bar, um grupo de adolescentes está estacionado. Categoria entre as mais odiosas aos olhos de Clara, que só de ouvir falar em “sofrimento juvenil” e outras tretas dos sociólogos sente o sangue subir à cabeça. Se eles viessem perguntar o que ela achavasabe sobre os jovens, ele respondia: “Ttodos os infratores em potencial". Ainda mais odioso quando, como agora, eles barram seu caminho sem mostrar que a viram. Assim, tendo apresentado as famílias capitulares para passear e aborrecimentos relacionados, ele alegremente passa a diversificar seu ódio. Para se abastecer de energia, observa com nojo a coleção de celulares desembainhados, saltos improváveis ​​e óculos escuros trincado. Assim, em equipamento de guerra – sacolas de compras de um lado e braço em ângulo agudo do outro –, ele dá uma cotovelada em seu caminho. Sob seus golpes inexoráveis, o rebanho é atordoado, vencido, disperso. Só que a beleza do grupo, que a mãe natureza dotou precocemente de um traseiro suntuoso, o indlevanta traiçoeiramente um sonoro: «Chitemm está morto! ". Clara, bunda desbotada e sem graça como o resto da pessoa, olha a mercadoria exposta dentro de um jeans justo com inveja disfarçada de reprovação. A menina, por sua vez, analisa Clara que, com seu olhar impiedoso, nota seus quarenta anos muito gastos, seu rosto cansado, sua maquiagem matinal desfeita, suas mãos segurando sacolas plásticas do supermercado. Sentindo-se patética, ela observa sua solitária passagem pela multidão na tarde de sábado, agora quase sábado à noite.

Procurando desesperadamente por um diversão, olhe para o relógio: “as semanase menos dez, tenho que me apressar! pense e, com uma reviravolta furiosa, evite um cigano com uma criança a reboque que se aproximou com a mão estendida. A cigana não desistiue, cola-os às costelas: «o bom fortea, senhora, boa sorte!». Então, dada a virada ruim, ele desiste. Mas primeiro surge a satisfação de desejar a Clara tribulações de vários tipos, recebendo em troca um anátema de morte prematura para sua prole. A monstruosidade do presságio deixa a cigana sem fôlego. Dominada pelo terror supersticioso, ela agarra a criança contra o peito e foge, proferindo encantamentos.

Clara leva o Stréptil Sant'Anna alle Paludi.

"Tenho que me apressar, caso contrário, quem quer que ouça! Logo, ou de todo, ela tem a boa ideia de sair da cama com o resultado que eu a encontro caída no chão, e quanto mais cuspo minha alma para levantá-la mais ela fica pesada de despeito. E se eu disser a ela que um dia desses ela vai quebrar a cabeça, ela finge chorar. Do que não seria capace para me fazer sentir culpado.

Ele desliza para dentro da porta. Sem fôlego, ela sobe os três lances de escada que levam até a casa. Uma vez no patamar, ela para. Só agora ela percebeu que as sacolas de compras cavaram sulcos dolorosos em seus dedos. Ele põe as sacolas de compras no chão e esfrega as mãos, depois começa a vasculhar a bolsa em busca das chaves. Quando os encontra, ele os observa com atenção, como se fossem um objeto estranho encontrado de surpresa no meio de suas coisas. Apesar da pressa de um momento atrás, ele está demorando. Mas o tempo gasto a olhar para um molho de chaves é apenas tempo perdido, aliás nem sequer é tempo, mas uma suspensão fictícia entre os afazeres que a levaram na rua e os que a esperam dentro de casa. Bem, podemos abrir a porta agora.

Clara gira a chave na fechadura e ao pisar no corredor escuro é atacada por uma convocação imperiosa. Mas teria sido pior se gritos de socorro tivessem vindo da sala no final do corredor.

"Clara, é você?"

«E quem tem 'dda ser! Espere, estou colocando as coisas no chão e eu venho."

«eu estava pensandoEu estava, mamãe! Mas o que você fez?

«Havia uma multidão no supermercado, estou aquiespere meia hora na fila do caixa.”

"E então o que mais você fez?"

«Então, como o ônibus não passoua, tive que voltar andando.”

«E graças a Deus você mantém suas pernas boas! Clara', tem muina'mmiezo 'uma via?

Desta vez Clara não se dá ao trabalho de responder e graças a Deus não pensa muito nisso. Ele leva as sacolas de compras para a cozinha, coloca na mesa e arruma as coisas que precisam ser guardadas na geladeira. O resto ele resolve depois, agora tem que preparar o jantar para a mãe, esperando que ele adormeça.

Quando a massa é cozida, ela derrete uma carne liofilizada nela. Prepare o tabuleiro: prato de vapor, água oligomineral, pêra homogeneizada, babete. Em tudo a alimentação de um bebê, não fosse o sortimento de remédios a serem tomados antes, durante e depois das refeições. Na porta da sala no final do corredor, ele respira fundo. Lá dentro, o cheiro de velho que invade a casa é tão intenso que chega a pegar na garganta. Coragem: quanto mais cedo você decidir entrar, mais cedo sairá.

Pelo fato de ela estar calada, ele deve ter adivinhado: curvada nas almofadas, ela cochilava. Colocando a bandeja na cômoda, Clara a endireita. Ela soltou um grito: «Jesusmary!Então você me faz gozar panteco! "

«Comer está prontopara. Gravata', tomar a pílula."

«Ufa! Eu sei desculpeta 'e eu piglia essas porcarias!»

«E eu estava entediado ao ouvir você dizer isso. Olha, você não está me fazendo um favor levando você láe remédios!”

«Ufa! E vamos ficar juntos 'stu pinnol…clare', que massa você fez para mim?»

"Estrelas."

"E qual é o produto liofilizado?"

"Vitela."

«Vitela comi ao meio-dia. Uau, você sabe que eu gosto de frango! Não estava lá, o de frango?"

Clara dá nó no babador e arruma a bandeja no colo.

«minhas mãos doem. Você me dá de comer, mamãe."

Como vingança, Clara enche a colher de massa quente e leva à boca. Mas ela, devastada no corpo, mas sempre presinstituição uma se em si, não cai nele: «Sofia, Clara'! Não vê como está quente?".

Para acabar com isso, Clara realiza com o espírito de uma operária de linha de montagem: faz-se porque tem de ser feito e tem de ser assim porque não há outra maneira. Sopre a colher, leve à boca e não pense. Afundar a colher de volta no prato, soprar, levar à boca. E não pense. Ela engole sua comida com voracidade, apesar de tudo tem um apego pela vida que faria inveja a uma jovem. A comida escorre pelo queixo, pelo pescoço e o estômago de Clara se contrai. Limpar a boca com um guardanapo a cada três colheradas não é uma preocupação, mas apenas mais um gesto necessário para acrescentar à sequência.

Agora ela está com falta de ar. Sinal de que a massa cozida demais encheu demais o estômago. Ela jamais o admitiria por medo de perder o fruto homogeneizado de que é ávida; mas que ele está em dificuldade pode ser entendido pelo fato de que, para se dar uma pausa, ele alterna uma pergunta a cada mordida. A começar, já que nunca se esquece de nada, daquele que ficou pendente.

«Clara', tem muina'mmiezo 'uma via?

«Uma babel. Veja como eu te conto: é a última vez que vou ao supermercado em um sábado. A partir da próxima semanaa maioria das compras é feita na sexta-feira.

«Clare', você passou na farmácia?

"Sim."

"E você se lembrou da ratafia?"

Jesus, a ratafia! Como poderia esquecê-lo, precisamente num sábado e com a tia Michelina que vem amanhã fazer a sua habitual visita de cortesia! Com a loja de Don Mariano colocada ao lado da porta como um lembrete, como isso poderia sair de sua mente? E agora quem diz isso a ele; no mínimo, ele vai desmaiar e despejar infinitas recriminações sobre ela. Dado o que espere por ela, exclui-se que foi uma simples distração: não há santos, são as blasfêmias dos ciganos que começam a acertar o alvo. Maldita seja! Que o mau-olhado que ele lançou sobre ela recaia sobre ela, que caiam sobre ela desastres que façam as pragas do Egito parecerem rosas e flores, que aquele mendigo imundo…

«Claret! Você se lembrou da ratafia?

"Sim Sim…"

«E você derramou no bovidro de cristal da Boêmia?”

«NAinda não, farei isso depois."

«Não se esqueça de embrulhar a garrafa vazia antes de jogá-la fora. Michelina, láuma' desculpe ajuda' é capaz 'e colocar'e mma puro força' 'para o lixo.'

«Não se preocupe, eu não esqueço.»

Clara troca a roupa da mãe. Vinte para as oito.

"Eu imploro, durma!" ele tira um travesseiro por trás das costas. “Se você dormir eu juro que amanhã você vai comer o frango liofilizado que eu neguei esta noite só para prdivirta-se com um pequeno prazer.”Ele a vira de lado e a aconchega nos lençóis, apertando-a estreito sobre ao corpo.

Dez para as oito.

"E dormir, por Deus!" Então, quando ele finalmente sente a respiração do casulo grotesco deitado na cama tornar-se rítmica e pesada, ele pega sua bolsa e sai.

Três minutos depois das oito. Agora as luzes da rua estão acesas, enquanto a placa com a inscrição está apagada Colonial Aversa. Embora esperasse por um milagre, Clara o esperava. O dono da loja, um velho viscoso e cerimonioso, é mais preciso que o sinal da hora e sempre fecha a persiana às oito horas. Agora, sem saber do abismo de desespero em que a mergulhou, dom Mariano Aversa estará a caminho de casa para preparar um caldo. “Estrafogue-se! " Clara o amaldiçoa. Ter fechado a loja na hora marcada é apenas o menor dos danos que aquele indivíduo lhe causou.

Foi ele, mais de trinta anos antes, quem vendeu para sua mãe a primeira garrafa de ratafià. QA imundície que, desde então, o mundo desabou, deve ser oferecida aos familiares em uma visita dominical. Parentes felizmente já todos falecidos com exceção da tia Michelina, que o Todo Poderoso ligue para ela o mais rápido possível e que pelo menos isso acabe jacovella ridículo de ratafia! Mas já tentou tantas vezes em vão chutar os pés de tia Michelina que perdeu a conta, e agora não quer mais insistir. Ela está muito concentrada em desejar uma morte lenta e dolorosa a Mariano Aversa que, por outro lado, a merece. Foi ele quem deu a entender à mãe sobre o engano.

Clara tinha apenas nove anos, mas ainda se lembra das palavras que foram ditas naquele dia:«Tem razão, linda senhora! Ele também fará o licor, mas é irritante que sua cunhada o lembre toda vez que você bebe vermuttino em casa. Se não fosse muito ousado, Eu gostaria de aconselhá-lo ...».

— O quê, dom Maria?

"Você já experimentou ratafia?"

"E o que é isso?"

«Licor de cereja muito perfumado. O que estou vendendo é produzido por uma fábrica em Ancona, mas seu burroTenho certeza que parece feito em casa."

"Sim?"

«Absolutamente! Depois de decantado em uma garrafa de cristal da Boêmia, ninguém pode duvidar que este elixir foi embaladoou de suas mãozinhas delicadas.”

«Eh, você facilita, você! Meus parentes são intrometidos… e então se minha cunhada me pedir a receita»

«Se ela te pedir, podes responder que foi um amigo que te deu, fazendo-te jurar pela vida de CLvocê tem razão em não dá-lo a ninguém”.

«não sei… juro por figosaí é pecado."

«Sacrossanto. Mas você você realmente não tem que fazer isso!"

"Sim mas…"

"O quê, moça bonita?"

«Soa estranho. Por que ela me diria para guardar a receita para mim?»

«Porque… Pecause o processo de fazer ratafià é um segredo que sua família vem transmitindo por gerações revelado apenas porque é você."

«Um segredo de família! Que boa ideia! Clare', você entende tudo, né mãe? Se você deixa algo pobre escapar de você, isso o tornaEstou tentando obter uma hemorragia nasal."

Assim pesa na consciência de Mariano Aversa a culpa antiga de ter dado a Clara o primeiro indício do quanto a mãe está inclinada a mentir. E que ninguém diga que foi apenas um golpe inocente, porque foi muito mais.

Foi o primeiro elo da cadeia de mentiras que a sufoca desde então.

«Este ano Claretta me ajudou a fazer o ratafià. Pobre criatura, já que o pai morreu em vez de brincar com os outros bcrianças querem ficar sozinhas comigo.”

«Obrigado mesmo assim, senhora. Diga a sua filha que não tenho nada contra. Mas o que você vai fazer, Claretta prefere estudar sozinho.”

«Mas que namorado! Minha Claretta não pensa nessas coisas. Na verdade, aquele que veio atrás dela se encaixava, mas ela não gostava dele. E como não teve coragem de dirigirLielo, eu tinha que fazer isso.

Cinco e oito. Cheio de sperância, Clara corre para o Vinhos e destilados no cantoque ainda está aberto.

«Catraca? » o homem atrás do balcão pergunta a ela, privando-a de qualquer ilusão residual.

Não há nada que você possa fazer, para ela tem que ser assim: tentar consertar um erro, não necessariamente dela, sempre lhe custa lágrimas e sangue. E toda vez que é esforço desperdiçado.

É um esforço inútil, nesta infeliz noite de sábado, vasculhar as grades do campo, aberto até tarde e abastecido com tudo menos ratoafia. Clara segue em direção ao ferrovia, cada passo corresponde a um pensamento dos dias consumidos atrás das necessidades do ser que está sugando o que resta de sua vida. "Cuidado paterno" eles os chamam, dizem que parece uma missão nobre, ao contrário, é apenas desgosto e exaustão, solidão e ressentimento. Até o morador de rua que agora passa por ela, arrastando sacolas cheias de trapos, certamente está melhor do que ela. Ele também passará fome, mas pelo menos é livre para ir e vir sem prestar contas a ninguém, para fazer sempre e apenas o que sua cabeça lhe manda. Livre até para começar a surtar de repente; e, de fato, ouça-o com que gosto de smadonna e foda-se quem estiver ao alcance! Clara acelera o passo, que algum dia seja alvo daquele descontentamento fluvial. Mas ele, que deve ter cheirado seu medo, depois de alcançá-la, volta e fica na frente dela.

O coração de Clara bate forte, o instinto lhe diz para correr, mas ela sabe que seria um erro, assim como é errado fugir se um cachorro latir para você. Então ela o olha diretamente no rosto e ele retribui o olhar, mas sem hostilidade. Há doçura misturada com compreensão em seus olhos; ela diria pena, se isso não fosse inadmissível. Então o homem fala com elalá. Diga uma palavra: «Longe». Depois disso, com ar de quem perdeu o pensamento, vai cuidar da sua vida.

Clara tenta se acalmar.

"Algumas pessoas deveriam trancá-la e jogar a chave fora! Quem sabe o que deu na cabeça daquele lunático para se permitir olhar para mim como se eu sabia e inventou isso'Distante'. Distante! Como se ele estivesse me mostrando uma saída. O que ele quis dizer? Mas não vale a pena pedir tanto. Ele realmente não quis dizer nada, seu cérebro ficou ruim para isso, ponto final. Distante. Mas veja se isso era para acontecer comigo também, principalmente esta noite quando ela descobrir que eu esqueci do ratafià quem quer que o ouça. Vamos esperar pelo menos que quando eu voltar ele ainda esteja dormindo. Distante. E se você não voltar? Eu poderia pegar um trem ou sentar na sala de espera da estação. Distante. Eu poderia fazer de um estado de transição o novo pivô em torno do qual minha vida gira, misturar-me com os moradores de rua e fazer fila para uma refeição quente do lado de fora do instituto das freiras em Calcutá. Distante. Eu poderia queimar os documentos e jogar cinzas na cabeça como último sinal de penitência por deixar minha mãe se condenar e morrer sozinha. Não duraria muito, sozinha ela não é capaz de fazer nada, mas afinal qual é a vida dela, e aí fica velha, enquanto eu... enquanto eu, já não é nome e não é mais funções, só cuidado para garantir que minha respiraçãoou não pare, talvez eu pudesse..."

Clara olha para o insegna da barra do sção, para o riprocure um sinal do destino.

"Não vou para casa sem o ratafià. Entre e pergunte, é isso que precisa ser feito. E se eu sair de mãos vazias, isso significa que minha vida pode mudar. Entre e pergunte, mas só por escrúpulo porque é certo que sairei de mãos vazias. Hoje à noite o ratafià não está em lugar nenhum, por que o bar da estação deveria tê-lo? Entre, pergunte e saia de mãos vazias, isso deve ser feito. Eentão, finalmente, serei livre.”

Clara abre a porta. Sem acender a luz, entre na casa. Nenhum ruído. Felizmente, ela ainda está dormindo. Ele vai até a cozinha, põe a garrafa de ratafia na mesa. Ele esvazia os envelopes, arruma tudo em seu lugar e quando tudo está em ordem ele se senta. Como havia feito algumas horas antes com as chaves, ele olha para a garrafa de ratafia como se nunca a tivesse visto antes. Quem sabe o que sabe, em tantos anos ela nunca teve vontade de prová-lo. Desparafuse a rolha, cheire o licor - tem cheiro de cereja. Belo achado, é feito com cerejas. Ele se levanta, pega um copo e coloca um dedo de licor nele. Então ele muda de ideia, coloca os lábios no gargalo da garrafa e dá um longo gole.

Bem, quem sabe o que se esperava, em vez disso, ratafià não sabe sobre oportunidades perdidas e vida desperdiçada, mas apenas sobre álcool e frutas. Um pouco doce demais, mas não é tão ruim afinal. Ele coloca a garrafa de volta no armário, então pensa sobre isso e coloca de volta na mesa. Para ser adocicado é adocicado, mas deixa um gosto amargo na boca. Sim, afinal não é ruim. Mais tarde, talvez, ele beba um pouco mais.

 

Antonella Ossório

É autora de textos infantis publicados, entre outros, por Einaudi, Rizzoli, Giunti, Electa. Escreveu textos para campanhas publicitárias e os enigmas em verso do n. 197 da série de quadrinhos Cão Dylan. O romance Se você entrar no círculo, você está livre (Rizzoli), escrito com Adama zoungrana, em 2010 foi incluído no White Ravens, a lista dos melhores livros infantis publicados no mundo. Também escreveu para adultos e teve contos publicados em antologias e jornais. Seu último romance A cura da água salgada foi lançado este ano por Neri Pozza.

Comente