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Emergência sanitária: problemas jurídicos e esfera cultural.

Emergência sanitária: problemas jurídicos e esfera cultural.

Este ano complicado chega ao fim mas com pesadas consequências sobretudo nos domínios social, económico e cultural, entre todo o sistema museológico e o das exposições permanentes. O encerramento durante a primeira fase de confinamento resultou na redução e suspensão de muitas atividades e no lançamento de ações promocionais de forma virtual de forma a poder manter uma relação com o utente fidelizado ou com o potencial visitante como utilizador de arte/cultura. No mesmo contexto de mercado, esse sofrimento foi registrado em locais privados, como galerias e feiras, que também foram obrigados a fechar e adiar eventos programados. Depois de um verão de trégua, com todas as precauções impostas pela Dpcm, voltámos infelizmente a uma segunda fase de restrições.

Solicitamos ao Advogado Giovanni Caroli, autor da seção Arte & Direito, uma opinião, do ponto de vista jurídico, sobre as medidas administrativas e legislativas vigentes durante a pandemia.
João Caroli – A pandemia fez com que vários regulamentos estaduais, regionais e locais fossem emitidos. A maioria destes são atos administrativos com o objetivo de reduzir e evitar a propagação do contágio da Covid 19. 
Já com o decreto-lei "Cura Italia", já foram estabelecidas medidas de caráter econômico para apoiar o setor cultural. Tudo reconfirmado com o decreto de “Relançamento” que instituiu um fundo especial denominado “Fundo de Emergência para Empresas e Instituições Culturais” (artigo 183.º, n.º 2). Ainda mais recentemente, o MiBACT criou novos fundos em benefício de todo o sistema cultural para atores, músicos, dançarinos, artistas circenses e trabalhadores (nota do MiBACT de 12 de novembro); outros suprimentos foram alocados para a atualização de museus não estatais, incluindo realidades até então não beneficiárias e também para o Museu de Quadrinhos de Milão (nota do MiBACT de 13 de novembro); Recordamos também o novo concurso de 10 milhões de euros para a renovação das exposições de outono (nota do MiBACT de 18 de novembro).

Advogado Giovanni Caroli

Com efeito, o agendamento e a não realização das exposições de outono-inverno já orçamentadas levariam o sistema museológico a prejuízos económicos consideráveis.
Mas quais são as questões legais?

João Caroli – Sim, de facto, as instituições culturais tiveram de se adaptar e ao mesmo tempo procurar métodos e aplicações digitais que, apesar de serem uma excelente solução para a utilização de “material” cultural, também devem ser analisados ​​à luz do Código Civil do Património Cultural . Dou-vos um exemplo: a digitalização de obras e a sua divulgação tendo em conta os direitos de imagem (Lei nº 22 de 1941 de abril de 633) Art. 108. Taxas de concessão, taxas de reprodução, depósito.
1. As taxas de concessão e as contraprestações relativas às reproduções de bens culturais são fixadas pela autoridade que consignou os bens tendo ainda em conta:
a) a natureza das atividades a que se referem as concessões de uso;
b) os meios e métodos de realização das reproduções;
c) o tipo e tempo de utilização dos espaços e bens;
d) a utilização e destinação das reproduções, bem como os benefícios econômicos delas decorrentes para o requerente.
2. As taxas e contrapartidas são normalmente pagas antecipadamente.
3. Não são cobradas taxas pelas reproduções solicitadas ou realizadas por particulares para uso pessoal ou de estudo, ou por entidades públicas ou privadas para efeitos de valorização, desde que sem fins lucrativos. Os requerentes são, em qualquer caso, obrigados a reembolsar as despesas incorridas pela administração concedente.
(parágrafo assim alterado pelo artigo 12, parágrafo 3º, letra a), a lei n. 106 de 2014 depois alterada pelo art. 1º, parágrafo 171, lei n. 124 de 2017).
3-bis. Em qualquer caso, as seguintes atividades são gratuitas, realizadas sem fins lucrativos, para fins de estudo, pesquisa, livre expressão do pensamento ou expressão criativa, promoção do conhecimento do patrimônio cultural:​ 
(parágrafo introduzido pelo artigo 12, parágrafo 3º, letra b), a lei nº. 106 de 2014).
1) a reprodução de bens culturais que não sejam bens de arquivo sujeitos a restrições de acessibilidade nos termos do capítulo III deste título, realizada com observância das disposições que protegem os direitos autorais e de forma que não implique contato físico com o bem, nem a exposição do mesmo a fontes de luz nem,​ 
dentro de institutos culturais, nem a utilização de estandes ou tripés;
(número assim alterado pelo artigo 1º, parágrafo 171, Lei nº 124 de 2017)
2) a divulgação por qualquer meio das imagens do patrimônio cultural, legitimamente adquiridas, para que não possam ser ulteriormente reproduzidas com fins lucrativos.
(número assim alterado pelo artigo 1º, parágrafo 171, Lei nº 124 de 2017)
4. Nos casos em que os danos aos bens culturais possam decorrer da actividade da concessão, a entidade que os tiver consignado determina o montante da caução, também constituída mediante garantia bancária ou seguro. Pelas mesmas razões, a caução é também devida nos casos de isenção do pagamento de taxas e encargos.
5. A caução é devolvida quando se verificar que os bens da concessão não sofreram danos e foram reembolsadas as despesas efectuadas.
6. Os valores mínimos das taxas e contrapartidas pelo uso e reprodução dos bens são fixados por disposição da administração outorgante.

Certamente um assunto que verá em breve a aplicação da nova “Diretiva de Direitos Autorais no Mercado Único Digital”: diretiva (UE) 2019/790 de 17 de abril de 2019 (cujo prazo de transposição é fixado em 7 de junho de 2021), que definirá as notícias sobre o tema da “liberalização”.

Giovanni Caroli - Exatamente. A Diretiva diz: “Considerando os rápidos desenvolvimentos tecnológicos que continuam a transformar a forma como as obras e outros materiais são criados, produzidos, distribuídos e explorados”, enquanto novos modelos de negócios e novos players surgem constantemente. A legislação relevante deve ser preparada para o futuro, de modo a não limitar os desenvolvimentos tecnológicos. Os objetivos e princípios estabelecidos pelo quadro jurídico da União em matéria de direitos de autor mantêm-se válidos. No entanto, ainda existe insegurança jurídica em relação a certas utilizações, incluindo utilizações transfronteiriças, de obras e outro material protegido no ambiente digital, tanto para os titulares de direitos como para os utilizadores. Em alguns domínios, tal como indicado na Comunicação da Comissão de 9 de dezembro de 2015 intitulada «Rumo a um quadro de direitos de autor moderno e mais europeu», é necessário adaptar e complementar o atual quadro de direitos de autor da União, salvaguardando um elevado nível de proteção dos direitos de autor e direitos conexos . A presente diretiva prevê regras para adaptar certas exceções e limitações aos direitos de autor e direitos conexos ao ambiente digital e ao contexto transfronteiriço, bem como medidas para facilitar determinados procedimentos de licenciamento, em particular, mas não limitado à divulgação de -comércio de obras e outros materiais e disponibilização online de obras audiovisuais em plataformas de video-on-demand, de forma a assegurar um acesso mais alargado aos conteúdos”. Para mais informações, indico abaixo o texto que apresenta a Diretiva na íntegra. 

Uma última pergunta. A pandemia acelerou a adoção e aplicação de novas tecnologias e, portanto, também dos relativos aspectos legais que estão muito desatualizados e vinculados a modelos de promoção e gestão de todo o sistema cultural.

João Caroli - "Factus morre hic transeat”. Iniciou-se um novo tempo a que devemos habituar-nos e adaptar-nos, comprometendo-nos a contribuir para a formulação de novas regras jurídicas que melhor protejam a actividade actual e previnam eventuais actualizações, pois não é possível saber a rapidez da transformação. Certamente será tarefa das novas gerações de profissionais da área jurídica, que vivendo esta época poderão melhor interpretar e se adaptar à evolução. Assim, se por um lado se conseguiram melhorias efetivas e se adquiriu a consciência da necessidade de uma utilização mais alargada das tecnologias disponíveis, por outro lado, emerge a necessidade urgente e urgente de um ajustamento regulamentar. A análise da realidade em que vivemos tem evidenciado como a aplicação de normas “tradicionais” está a ser considerada em várias partes inadequada para aquilo que são as necessidades especiais no domínio tecnológico. Portanto, a principal tarefa dos estudiosos e técnicos será necessariamente a de desenvolver uma disciplina mais especializada capaz de contribuir para o correto desenvolvimento tecnológico.

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